A sua marca tem pressa por quê?
Como a corrida desenfreada da era digital têm matado a profundidade das pessoas e das marcas
Essa tem sido uma reflexão constante nos últimos dias, surgindo de uma necessidade real de frear e realinhar a rota.
Estamos sempre com pressa, mas por quê?
Antes de mergulharmos juntos nessa reflexão, quero compartilhar não apenas uma música, mas a playlist que tem acompanhado minha leitura diária:
E caso você ainda não siga o meu conteúdo, te convido a ficar por dentro de muito repertório sobre arte, beleza e branding.
Fernanda Torres e o triunfo aos (quase) 60
Talvez essa comparação já tenha se desgastado, mas foi a partir dela que essa reflexão começou a ecoar em mim.
Na última quinta-feira, Fernanda Torres recebeu a tão esperada indicação ao Oscar. Depois de levar o Globo de Ouro para casa (e fazer as redes sociais americanas ferverem!), todo mundo estava de olho nesse momento. E então começaram a circular vídeos antigos, dela ainda muito jovem, afirmando que nunca ganharia um Oscar (o vídeo é longo, mas ela diz isso logo no início).
E foi aí que algo me atingiu em cheio.
Fernanda estreou no cinema aos 13 anos. Agora, 46 anos depois, está entre as favoritas a levar a estatueta para casa (acredito que ela só perde, se for para a Demi Moore!). Então, por que temos tanta pressa de fazer sucesso aos 20, 30 anos?
Vera Wang tinha 40 quando começou a criar vestidos de noiva. Hoje, é um dos maiores nomes do setor.
Charles Darwin publicou A Origem das Espécies aos 50. E naquela época, 50 anos eram quase os 80 de hoje.
E já que vou falar de Alta Costura logo mais, que tal lembrarmos que Giorgio Armani também começou sua marca aos 40 e, hoje, com 90 é referência em elegância, luxo e qualidade.
E a lista continua.
Mas aí entram as redes sociais, acelerando tudo e deixando marcas profundas na nossa percepção sobre tempo e amadurecimento. Como não se sentir pressionado ao ver adolescentes sem diploma faturando milhões no TikTok com dancinhas? Ou “comediantes” (e coloco aspas porque, sejamos sinceros, poucos realmente fazem rir) já milionários antes dos 30?
Enquanto isso, nós seguimos estudando, nos especializando, nos dedicando – e, muitas vezes, lutando para bater a meta financeira do mês.
Mas aqui vai uma provocação: nos últimos cinco anos, quantos influencers, comediantes ou celebridades que surgiram em meio a polêmicas realmente se tornaram uma marca?
Quantos deles, em qualquer área, você consegue lembrar por um diferencial autêntico? Quantos fazem falta de verdade?
Se ninguém vem à sua mente, é porque eles não viraram uma marca.
“No futuro, todos terão seus 15 minutos de fama.” - Andy Warhol
Haute Couture: a prova de que marca se faz com o tempo
Nenhuma marca nasce da noite para o dia.
Você pode até montar um negócio hoje para lançar amanhã. Criar um plano de negócios, definir valores, missão e visão, fazer um logo no Canva, abrir uma página no Instagram. Pronto, uma marca, certo?
Errado.
As redes sociais podem até te convencer do contrário. Quantos vídeos você já viu prometendo crescimento no Instagram em 30 dias? Ou mentorias garantindo 100k em dois meses? E as famosas faceless accounts que ensinam a bombar em cinco dias?
Mas nada disso é sobre marca.
Gestão, identidade visual, produtos e serviços – tudo isso faz parte da construção de um negócio. Mas uma marca? Uma marca precisa de tempo.
Tempo para se consolidar.
Tempo para ser reconhecida.
Tempo para ser vista.
A Semana de Alta Costura de Paris pode parecer previsível para alguns – e para algumas marcas –, mas continua trazendo grandes lições sobre isso. Trago aqui alguns exemplos:
Schiaparelli
Nos meus stories no início da semana, falei sobre a marca e como Daniel Roseberry, seu diretor criativo, entende a essência construída pela própria Elsa Schiaparelli.
A marca nasceu no Surrealismo, um dos movimentos mais controversos da História da Arte, e nunca tentou agradar a todos. Elsa sabia exatamente que sua criação não era para todas as mulheres.
Fundada em 1923, a Schiaparelli só começou a ganhar notoriedade em 1927, quando o icônico Bow Sweater virou assunto. Foi apenas no ano seguinte, em 1928, que Elsa, influenciada por sua amizade com Salvador Dalí, Max Ernst e Jean Cocteau, abraçou por completo sua veia artística – e foi aí que a verdadeira Schiaparelli nasceu.
Elsa não deixou apenas um legado na moda, mas na arte como um todo.
Perceba: foram necessários quatro anos para que ela encontrasse e assumisse sua essência. Mas são mais de cem anos de história para que o mundo conheça a marca Schiaparelli. E, mesmo sem sua criadora, sua essência continua intacta.
Na coleção mais recente, Roseberry inova sem precisar seguir a tendência do minimalismo. Em vez disso, presta uma verdadeira homenagem a Elsa, trazendo referências marcantes dos grandes sucessos da marca.


Chanel
Apesar de não ter sido o primeiro nome associado à Alta Costura – esse título pertence a Charles Frederick Worth –, Chanel é, sem dúvida, um dos maiores símbolos de sucesso do setor. Afinal, a marca permanece relevante até hoje.
A primeira boutique de Alta Costura da Chanel foi inaugurada em Biarritz, França, em 1915. Agora, 110 anos depois, a coleção de 2025 resgata essa história. Na época, Biarritz era o refúgio da alta sociedade, que fugia dos horrores da Primeira Guerra em busca de um cenário paradisíaco. Foi ali que Chanel se consolidou – e foi essa atmosfera que inspirou a equipe de design da Maison para a passarela deste ano.
A lição do tempo, dessa vez, vem da empresa Chanel, que nos ensina o quanto ele é essencial. Desde a saída de Virginie Viard, em junho do ano passado, os últimos desfiles foram assinados por toda a equipe criativa. Matthieu Blazy foi anunciado como novo diretor criativo em dezembro de 2024, mas se a marca soube esperar até agora, por que apressar as coisas? Não há sequer como criar uma coleção de Alta Costura – um trabalho inteiramente feito à mão – em um mês.
A verdade é que tanto a marca quanto o público estão sedentos por uma nova era na Chanel. Mesmo antes da saída de Virginie Viard, a sensação era de que a Maison estava estagnada. As comparações com Karl Lagerfeld nunca cessaram, e tenho para mim que foi isso que a fez tomar uma saída repentina.
Mas nenhuma marca se constrói sem tempo. E Blazy sabe o peso que está prestes a carregar nos ombros.
Se é preciso esperar até setembro para sua estreia, que esperemos.

Mais do que uma lição sobre paciência, Chanel nos lembra que uma marca precisa saber o valor que carrega. Mesmo em meio a críticas, a Maison continua crescendo. E no fim das contas, é melhor manter coleções medianas que sustentem a reputação da marca do que arriscar uma revolução que possa comprometer 115 anos de história.
Valentino
Pegando esse gancho – e fazendo uma adição de última hora! – Valentino é mais uma prova de que tempo é tudo.
Em setembro do ano passado, Alessandro Michele fez sua estreia na maison menos de seis meses após ser contratado. Num cronograma ideal, essa coleção teria começado a ser desenvolvida pelo menos um ano antes. Ou seja, Michele já havia perdido mais da metade do tempo e precisaria correr.
Apesar de ter entregado uma belíssima apresentação, as comparações com sua era na Gucci foram inevitáveis – e nem sempre favoráveis. Muitos elogiaram o resgate das referências dos anos 60 da verdadeira essência da Valentino, mas peças que remetiam demais ao seu trabalho anterior acabaram ofuscando sua estreia.
Diante disso, não faltou gente duvidando se Michele realmente se encaixaria na Valentino. Até que ontem, 29 de janeiro de 2025, ele mostrou a que veio.
Como descreveu a Harper’s Bazaar, a coleção está “sublimemente transportadora”. E de fato, está.
Desde o conceito, ricamente trabalhado na cultura, já fica claro que o cérebro de Michele é daqueles que a gente adoraria dissecar para entender de onde vem tanta conexão criativa. Como explica Brooke Bobb:
A coleção chama-se Vertigineux, que significa ‘tonto’ (no sentido de vertigem) em francês, e lembra o estudo das listas do semiólogo italiano Umberto Eco. Eco escreve sobre as infinitas qualidades e a capacidade das listas de criarem cultura e ordem (às vezes, nem sempre). Michele articulou nas notas da coleção que, para ele, as listas representam ‘a viagem à vertigem de uma multiplicidade inacabada’. Os textos de Eco ‘me levaram a imaginar cada vestido único, finito e irrepetível como um catálogo de palavras ininterrupto e potencialmente infinito’.
O desfile se transformou em uma verdadeira viagem pelos arquivos da Valentino, pela literatura, pela fantasia e por referências artísticas de longa data. Sua abordagem não linear para a confecção das peças mais uma vez trouxe um universo de possibilidades para o produto final.
Cada modelo, ao desfilar, fazia uma pausa diante de uma tela com um ticker vermelho, onde apareciam palavras soltas descrevendo o look – “justaposição”, “visão”, “referências”, “constelação”.
E aqui, mais uma vez, a lição sobre tempo se reafirma.
Quem duvidou de Michele precisou esperar para ver.
Ele pode não ter acertado de primeira, pode não ter feito um trabalho impecável na estreia – talvez por falta de tempo, talvez por ajuste. Mas com o tempo necessário, ele conseguiu deixar sua primeira (e bela!) marca.
A pressa é inimiga da perfeição
Toda essa reflexão se fechou esta semana quando li o livro Os 5 Princípios da Psicodinâmica das Cores, de Osny Ramos.
Se ainda não ficou claro até aqui que marca precisa de tempo, voltemos à base: o famoso primal branding. Embora tenha suas falhas, esse conceito traz um grande valor, especialmente quando falamos de um dos pilares mais impactantes de uma identidade visual: a paleta de cores.
As cores falam sem que a gente perceba. Seu significado vai muito além do básico que tentamos definir no dia a dia. Elas atuam na nossa mente de forma psíquica, influenciadas por cinco princípios fundamentais:
Físico: Cores têm frequência, e isso é imutável. Tons vibrantes possuem frequência mais alta, por isso nos energizam. Tons suaves têm frequência mais baixa, por isso nos acalmam.
Quântico: As cores são formadas por fótons – partículas abstratas da natureza. Cada cor carrega sua própria essência.
Ontológico: Explica por que enxergamos o mundo num princípio de vermelho, verde e azul. Esse princípio remete à formação do universo: seja pelo Big Bang ou por um ato de Deus, o mundo começou com uma grande explosão vermelha – por isso associamos essa cor à energia, fogo e intensidade.
Filogenético: Trata da herança de memória que carregamos dos nossos antepassados, revelando como cada cor carrega uma história e desperta emoções ancestrais.
Semiótico: Esse é o princípio mais explorado (e, muitas vezes, único) por profissionais que trabalham com cor. Ele se relaciona com a simbologia das cores e como as interpretamos culturalmente.
Certo, mas por que estou falando tudo isso?
Criar uma marca exige tempo. Quando você quer algo “pra ontem”, está matando um processo essencial de estudo e refinamento.
Pegue a profundidade das cores, por exemplo.
Esses cinco princípios existem para evitar escolhas equivocadas – como um tom de verde que remete à umidade do musgo e causa repulsa na maioria das pessoas, ou um azul tão frio que afasta quem você gostaria de atrair.
E isso não se trata apenas de semiótica (o quinto princípio da lista). Essa compreensão vem de alguém que sempre foi obcecada por cores e quis entender por que, mesmo em culturas diferentes, temos percepções tão semelhantes sobre elas.
Se você está criando sua marca do zero – ou finalmente buscando um direcionamento para a marca que já existe dentro de você, mas ainda não foi trabalhada – precisa compreender tudo isso.
Nos voltemos para um exemplo básico: quando começamos a estudar semiótica, aprendemos que a composição de amarelo com vermelho dá fome. Mas se todo restaurante usa essa dupla, por essa simples simbologia, cadê o diferencial? E se o restaurante é vegano e quer usar verde, qual o tom exato para que a cor não cause enjoo ou aversão das pessoas?
Compreender a essência das cores é só uma etapa (muito) pequena de uma construção de marca que é repleta de símbolos. Cada detalhe, cada elemento conta. Um único erro pode matar algo que nem começou.
Enfim, uma marca
Para você que me acompanha e está sempre por aqui, que tal um pouco de ação?
Uma marca precisa de tempo para crescer, mas não é apenas um conceito imaginado hoje que ganhará relevância daqui a 5, 10 ou 20 anos. São as ações que você toma agora que constroem essa trajetória.
Se você está no processo de construção ou reposicionamento de marca, por onde começar? Antes de mais nada, responda a três perguntas essenciais:
Quem eu sou (sua história)
O que eu faço (o tangível, o que você entrega)
Para quem eu faço (seu público, quem precisa do seu trabalho).
Essas respostas começam a traçar o caminho que sua marca vai ganhar.
Depois disso, reflita sobre seus valores, crenças e propósito. Isso significa entender não apenas o que você vende, mas o que sua marca representa, o que ela defende e como quer ser percebida. Esses valores são o alicerce que sustentam sua marca e se refletem em cada interação com o cliente. São eles diferenciam aqueles que fazem qualquer coisa pela fama daqueles que constroem algo duradouro e verdadeiro.
Geralmente, as marcas que deixam um legado pertencem ao segundo grupo. Seus valores moldam a cultura da sua empresa, influenciam as pessoas com quem você se associa e criam identificação com o público certo. Eles direcionam suas ações, fortalecem sua comunicação e evitam que sua marca se perca em modismos passageiros. A urgência da era digital tem matado muitas marcas justamente aqui — quando se vendem por qualquer oportunidade, sem critério ou coerência.
É nesse ponto que chegamos a outra questão essencial: onde você quer chegar? Ter clareza sobre seu destino ajuda a definir a rota e compreender que o tempo faz parte dela. Saber seus objetivos e visualizar o futuro da sua marca permite alinhar estratégias e tomar decisões mais assertivas.
A partir daqui, passamos à definição dos elementos visuais, que darão forma à sua marca e reforçarão a identidade que já foi estruturada. É também o momento de definir as ações que tornarão seu objetivo uma realidade.
Não existe um único caminho que todas as marcas seguem. Além do tempo, sua história é única, e sua trajetória será igualmente singular. O mais importante é entender qual é a melhor rota PARA VOCÊ e seguir com consistência, estratégia e propósito.
—
Para aumentar o seu repertório:
Conheça - um breve história sobre o famoso sweater de Elsa Schiaparelli (em inglês).
Inspire-se - a magnífica coleção de Alessandro Michelle para a Valentino (em português).
Entenda - quem foi o “pai” da Alta Costura, Charles Frederick Worth (em inglês).
Assista - o Ted Talk de Youri Sawerschel sobre como fazer qualquer coisa virar marca.
—
Se você sente que precisa de alguém para te guiar nessa jornada. Conte comigo.
Mais uma vez, merci por me acompanhar. Nos vemos na semana que vem!
Bisous,
Francy.